Bacafá

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quinta-feira, 10 de junho de 2010

Contos de quinta - Reencontros.

Reencontros.

Há quanto tempo não via meus amigos! Tantos amigos assim. Velhos e bons amigos. O tempo vem, a idade chega com ele. Mas todos muito sérios, sisudos. Não se parecem com aqueles meus velhos camaradas do tempo de escola, de faculdade, de festas. Bons tempos. Memoráveis e inesquecíveis tempos de muitas risadas e bebedeiras. Mas hoje estão compenetrados demais. A vida moderna muitas vezes mata a espontaneidade e a alegria. Contudo, espantam-me ver meus amigos assim. Vá lá, culpa das correrias e preocupações do cotidiano.

A família toda assim reunida também fazia muito tempo que eu não via. Meus pais, meus tios, meus primos. Quanta festa. Na realidade são todos de festa, e sempre tem um tio e um primo mais festeiros. Toda família tem. Sempre rindo e piadistas. Nossa família também tem, óbvio. E lá estão os dois num canto provavelmente contando piadas de nível duvidoso, pois os outros tios os olham de viés e cara feia. Diga-se de passagem, muito sérios meus tios e tias. Meus pais, onde estão meus pais? Perdi-os de vista.

Meus filhos. Estão chegando meus filhos. Que alegria vê-los. Acompanhandos por seus pares. Ela com o namorado, que sempre achei meio sem graça, é verdade, mas que também sempre respeitei pelo jeito que trata minha filha. Sério demais para a espevitada da minha filha, mas se se entendem, o que vou eu fazer, não é? Às vezes ele esquece que são jovens e que deve levá-la para umas loucuras. Mas, tudo bem, são novos e ainda aprendem. Meu filho, outro espevitado, já apareceu com outra namorada. Ou será que é a mesma? Nunca tenho certeza. Seja porque troca muito, seja porque são todas parecidas. Já pedi pra que ele pelo menos revezasse entre loiras e morenas para que tivesse alguma chance de evitar gafes. Certa vez chamei a namorada nova pelo nome da antiga, convicto de que era a mesma. Era tão sensível, a garota, que no segundo dia já terminou com meu filho. Pior, talvez, foi quando falei: “Namorada nova, meu filho. Como é o nome da moça?” E a resposta foi rápida: “Ô sogrinho, não lembra mais de mim? Só mudei o cabelo”. Coisas de um homem desligado como eu. Menos mau que todos rimos. A de hoje não é nem a sensível e nem a camaleoa.

E a festa aqui parece boa. Até minha ex-mulher chegou. Escritora de sucesso não tinha mais tempo para mim. O relacionamento foi desgastando. Ela enterrada no trabalho e eu me acomodando. Os livros vendendo cada vez mais, entrando sempre nas lista de best sellers, viagens e congressos e palestras e eu dancei. Está ainda mais linda, com seu comportamento firme de sempre. Tudo bem que nossos últimos anos não foram dos mais animados, mas também não tem necessidade destes óculos escuros de grife. Coisas da minha ex. Não perde a chance de esnobar. Já que nem falou comigo, não vou insistir. Não nego que deu saudade dos tempos da nossa juventude. Se bem que para velhos também não servimos.

Está uma festa meio parada, essa. Silêncio, só murmurinhos. Falando nisso, onde estão meus pais? E meus filhos? Também sumiram. Peraí, o que é aquilo? Parece um caixão. Meus pais ao lado, meus filhos. Por que choram?

Mas sou eu aí dentro. Como isso? Estou aqui. Alôô... não tem ninguém me vendo, por acaso? Bem que estranhei que ninguém me cumprimentava. O que é isso, afinal? O que está acontecendo? O que aconteceu? Como fui parar aí dentro desse caixão. Sou muito novo, vejam. Ainda tenho muito o que viver. Reviver meu amor, brincar com meus filhos, conhecer meus netos. O que houve, pessoal? Fui dormir tão bem ontem. Será que foi ontem? O que estou fazendo aí dentro? Não estou morto, estou aqui. Ei, ei, parem, não fechem o caixão. É cedo... não fechem. Vou morrer sufocado aí dentro... morrer... só posso estar ficando doido mesmo. Vou fechar os olhos para ver se acordo desse pesadelo.

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