A dama da noite.
Todas as noites ela saía. Sem rumo. Naquela noite não foi diferente. Sem rumo. Fria. Ela. A noite. Seus passos certos, mas nem tão firmes. Seu sobretudo protegia e lhe dava um certo ar noir, com sua saia curta, suas meias finas, seu salto alto. Tudo preto, como a noite. Apenas a blusa destoava na cor, sem estragar o conjunto.
A brisa fria batia-lhe no rosto. Os lábios escondidos pelo batom vermelho destacam sua boca carnuda. Os olhos negros semicerrados por causa do frio e da brisa lhe davam um ar de concentração.
Escolheu o bar e entrou. Sentou-se ao balcão, o barman lhe sorriu, os homens ficaram olhando e desejando. O bar era fino, requintado, de fregueses ricos ou que gostariam de ser. Ela pediu um dry martini. Sem azeitona.
Apenas o terceiro pretendente lhe interessou. Mais novo que ela uns 7 ou 8 anos, talvez. Sem conversa de dinheiro, sem conversa do sucesso da sua empresa sem conversa sobre os carros que tem. Somente um agradável e trivial papo. Alguns sorrisos, algumas risadas, mesmo de piadas sem graça. Apenas pela alegria do momento. Depois de algumas doses, saíram.
O apartamento dele era grande, mas espartanamente decorado. Móveis assinados por famosos designers. Ambientes amplos. Tudo calculado com o objetivo de que não parecesse. O som tomou conta do lugar, sem incomodar. Ela quis continuar no dry martini. Ele preparou e já deixou por perto as garrafas de vermute e de gim e o balde de gelo. Sem azeitona. Os sapatos dela já descansavam ao lado do tapete alto e negro.
Ainda era relativamente cedo, mas os beijos já ferviam os dois corpos. Sem artifícios de ataque ou medidas defensivas. Os móveis caros e assinados foram testemunhas de tudo. Os corpos suados e esticados no chão. A respiração ofegante ficando mais calma.
Ela se levantou, olhou para ele e, ali na sua frente, vestiu vagarosamente a calcinha, as meias, a saia e a blusa. Apanhou os sapatos de salto alto, sentou-se no sofá, ajustou-os, levantou-se, colocou o sobretudo e depois de lhe mandar um beijo sem beija-lo, foi embora.
Na rua a brisa da madrugada estava ainda mais fria. Sem batom, seus lábios quentes ficaram levemente arroxeados. Um belo e discreto sorriso de prazer no rosto.
Acordou tarde, só de calcinha preparou seu chá, pegou o jornal na frente da porta. Nas páginas policiais viu a manchete do jovem profissional liberal assassinado com um furador de gelo, nu, deitado sobre o alto e negro tapete importado. Apenas os móveis caros como testemunhas.
Um comentário:
Esse conto nem deveria ser de quinta... é de primeira!
Me lembrou uma história conhecida...
Chiquérrima ela, não?
Só pra constar: eu, prefiro COM a azeitona! rs
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