Semana passada o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu sobre as relações homossexuais ou homoafetivas. E os doutos ministros caminharam bem em suas conclusões. Isso não quer dizer que o preconceito vá sumir agora, da noite para o dia, instantaneamente, mas, por outro lado, entendo que é ponto bastante favorável às liberdades individuais e, consequentemente, à democracia como um todo.
É fato, porém, que ninguém vai ser obrigado, por conta desta decisão do STF, a gostar de homossexuais ou homossexualidade. Assim como ninguém é obrigado a gostar de casais heterossexuais, de pessoas negras, brancas, amarelas ou vermelhas, de ricos ou de pobres, de cristãos, muçulmanos ou ateus. O que ninguém pode é prejudicar, destratar, ofender, agir preconceituosamente ou tolher direitos dessas pessoas (homo ou heterossexuais, brancos ou negros, pobres ou ricos, crentes ou agnósticos).
E, ao contrário do que alguns estão dizendo, seja por má-fé, seja por desconhecimento de causa, o STF não criou uma “lei nova” que autoriza as relações homoafetivas. Na realidade, como se sabe, relações entre casais do mesmo sexo existem desde sempre e em todas as culturas. Dizem os especialistas que até entre animais ditos irracionais a homossexualidade existe. O que o STF fez ou pretendeu fazer foi sobrepor princípios fundamentais, em especial o da dignidade humana, sobre o preconceito.
Mais, se formos analisar questões de preconceito envolvendo as relações amorosas temos outros exemplos que remontam de muito tempo e ainda não foram completamente superados.
Quem nunca ouviu falar de casais enamorados que foram separados pelos pais por conta das diferenças sociais? Não seria esse comportamento, por acaso, uma espécie de preconceito também?
Hoje ainda temos, embora de maneira disfarçada, o preconceito racial. Há não muito tempo, por exemplo, casamentos entre pessoas de “cores” diferentes não eram aceitos pela sociedade, principalmente pelos brancos ricos.
Todavia, tanto em um caso (diferença social) como em outro (diferença racial), a sociedade, de modo geral, vem assimilando e percebendo que a diferença é o menos importante quando o amor existe.
Entendo que da mesma forma ocorrerá com a questão dos relacionamentos e casais homoafetivos. As pessoas perceberão que não há qualquer perigo ou desvio. Nem o instituto família corre riscos, diferentemente do que aduzem alguns religiosos mais radicais (não obstante pregarem tolerância, respeito e amor e dizerem que o homem foi feito à imagem e semelhança de Deus). Com relação ao divórcio os argumentos (sobre o fim da família) foram os mesmos e as pessoas continuam se casando e as famílias se constituindo.
Por fim cabe dizer que os tribunais e magistrados são muito menos preconceituosos do que a sociedade em geral, pois, antes desta decisão no STF, pulularam decisões judiciais pelo país inteiro resguardando os direitos dos homossexuais em questões de separação de patrimônio, herança, pensões previdenciárias, etc. E tudo isso porque, no dia-a-dia, estas pessoas enfrentavam obstáculos só possíveis de transpor com a deusa Têmis intercedendo.
Para encerrar, vale a pena citar manifestações de alguns dos ministros julgadores:
“Se o reconhecimento da entidade familiar depende apenas da opção livre e responsável de constituição de vida comum para promover a dignidade dos partícipes, regida pelo afeto existente entre eles, então não parece haver dúvida de que a Constituição Federal de 1988 permite seja a união homoafetiva admitida como tal." (Marco Aurélio) .
“Aqueles que fazem sua opção pela união homoafetiva não podem ser desigualados em sua cidadania. Ninguém pode ser de uma classe de cidadãos diferentes e inferiores, porque fizeram a escolha afetiva e sexual diferente da maioria.” (Cármen Lúcia).
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Em tempo: originalmente, na coluna do Correio do Povo, o texto saiu com a expressão "homossexualismo" em vez de "homossexualidade". Alertado pela professora Mara Isa sobre relação do sufixo "ismo" com patologias, fiz a mudança para o texto no blog e peço desculpas aos homossexuais e leitores em geral pelo equívoco, esclarecendo que em nenhum momento houve a intenção de conotação pejorativa.
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