Dia desses conversava com meu sócio Renato sobre copos de refrigerante. Na realidade, sobre a quantidade de refrigerante nos copos. Comentamos sobre como as crianças e, ainda mais, os adolescentes se comportam diante de um copo e uma garrafa de refrigerante: enchem, até a boca, se possível.
E lembramos que nossos pais nos ensinaram que não se enche copo até a boca. Questão de educação. E mais do que isso, questão de respeito, penso. Pra que encher o copo? A idéia é - ou era: se não satisfizer a sede, coloque mais depois. Ou, se não tiver suficiente para todos, que divida-se em quantidades solidárias.
Quem não se lembra daquelas brincadeiras de criança, à mesa dos aniversários ou outras festas, de ficar colocando o refrigerante ou suco nos copos até que ficassem na mesma medida? Ninguém podia ficar com mais do que os outros! Não lembro de enchermos até derramar ou quase. Hoje essa brincadeira até perderia sua graça porque todo mundo simplesmente assoberba o líquido até a boca do copo. Sempre ficariam iguais.
Fiquei pensando sobre isso...
Por que essa inversão ou modificação de valores? Nem vou falar do fato de que antes refrigerante era final de semana e olhe lá, e hoje é quase uma bebida diária - para muitos é mais do que isso; já conheci família que tomava coca-cola no café da manhã!!
Lembrei que os McDonald's e Bob's da vida nos enfiam aqueles copos cheios. E cada vez maiores. Como disse o Danilo Gentili na sua apresentação humorística na SCAR, sábados atrás: se a gente quiser comprar alguma coisa menor nessas lanchonetes, caso consiga, fica até constrangido. E tem sempre a moça que insiste: "senhor, por mais cinquenta centavos o senhor ganha um hiperbigultramega copo de refrigerante e uma ultramegahiperbig batata frita, senhor". Caso a gente negue, ela empurra: "mas, senhor, só por mais cinquenta centavos, senhor."
Voltando ao assunto: esses copos gigantes e cheios - quem é que bebe meio litro de coca-cola sozinho num almoço?? - são apenas a ponta do iceberg. Vivemos num mundo consumista, extremamente consumista. E essa idéia de consumo descontrolado é impregnado nas nossas mentes desde crianças. Agora mais do que antes. Dessa forma, um copo cheio até a boca nada mais é do que o reflexo do "mais e mais e mais e mais...".
Outro fator que, na minha opinião, também colabora - e muito - com essa situação é a simples incapacidade dos pais de usarem uma palavra tão simples quanto eficiente: NÃO.
Parece que os pais, por culpa, medo, irresponsabilidade, desleixo ou projeção da infância que gostariam de ter tido, esqueceram a importância de dar limites aos seus filhos. Por que se tem que concordar com tudo? Agora os pais vão virar reféns dos seus filhos? Os pais têm vergonha que seus filhos façam escândalos no supermercado porque não ganham tudo o que pedem? Os pais têm medo de ter filhos deslocados por não darem tudo o que o pai dos vizinhos dá? Os pais têm medo de ser odiados por seus filhos porque não ganharam o último dvd, o último game, o último modelo de celular, de tênis ou seja lá do que for?
E, ainda pior, já que não conseguem dar tudo, tem aqueles que optam pelos produtos piratas para "baratear" suas frustrações, ensinando mais uma coisa errada para os filhos: que sonegar o trabalho de quem produz, de quem rala para ter as idéias e fazer ou imaginar aquilo, é certo!!
No final das contas, essas crianças, além de conseguirem tudo que pedem, de encherem o copo de coca-cola até derramar, de faltar com o respeito com quem trabalha (porque quem desconsidera o trabalho do artista tem grande tendência a desrespeitar o trabalho da faxineira do shopping, do porteiro do prédio, do motorista do ônibus, do professor, do policial, do médico...), quando crescerem vão acabar lendo livros de auto-ajuda e lotando as salas de espera dos psicólogos porque os livros de auto-ajuda não fizeram os milagres que prometeram.
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Em tempo: tenho filha adolescente e também cometo meus erros, mas refletindo tende-se a não repeti-los. Espero.
Em tempo 2: quanto à publicidade com que faz boa parte das pessoas se sentirem mal por não conseguirem comprar tudo o que gostariam ou o que seus filhos querem, tenho opinião formada. Sou radicalmente contra publicidade para o público infantil em horário diurno ou em revistas para crianças. Os pais é que devem escolher o que comprar, sem pressão. Em outra postagem falarei do assunto.
Um comentário:
Acredito que isso é uma questão de "berço" da criança. O que falta para essas crianças, como comentado no post, é educação vinda dos pais.
Além do pai apreender a dizer o NÃO, tem que ainda, criar maneiras coercitivas de educar o seu filho. Não temer ao dar uma surra nele, caso for preciso.
Outro fator, como no post, é que as crianças estão realmente muito egocentricas. Hoje, elas passam horas sozinhas, jogando video-game ou no computador, até mesmo ficam escutando mp3 player quando os seus amigos estão em volta. Acabaram aquelas brincadeiras em grupos (esconde-esconde, pega-pega, policia e ladrão, entre outras) que quanto mais gente tinha para brincar, melhor era. Isso fez com que mudasse culturalmente a forma de agir e pensar de nossas crianças.
em nosso tempo.
Lá em casa não era diferente, como o Raphael comentou. QUANDO sobrava o resto de coca do final de semana, parelhava o copo com o do meu irmão e dividia igualmente. Se passasse, cai-se na porrada. E logo, meus pai interferiam com uma espada de são jorge para "acalmar" os animos.
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