Bacafá
quarta-feira, 5 de setembro de 2012
Do direito de morrer.
Para começarmos nossa conversa de hoje a compreensão de dois termos é importante: eutanásia e ortotanásia. A primeira é a prática para abreviar a vida de um paciente terminal. Difere da ortotanásia porque esta é a não interferência médica para permitir que o paciente morra com a evolução natural da doença. Ou seja, quando se deixa de utilizar meios científicos ou tecnológicos para prorrogar a vida de um paciente desenganado.
Em outras palavras, na eutanásia o médico adota medidas que aceleram o óbito enquanto na ortotanásia o médico não aplica tratamentos que possivelmente não resolveriam o problema. Enquanto aquela é considerada homicídio, esta é aceita pela comunidade médica.
Em novembro de 2006, o Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou a Resolução n. 1805/2006, que permite “ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal”. O Ministério Público Federal (de novo?) entrou com uma ação querendo fosse decretada a nulidade da referida resolução. Felizmente a demanda foi julgada improcedente em 2010.
O CFM agora mais uma vez evoluiu positivamente na relação médico-paciente. Com a Resolução n. 1995/2012 estabeleceu os critérios para que qualquer pessoa maior de idade e consciente possa definir junto ao seu médico quais os limites da terapia na fase terminal. Formalmente tal ajuste chama-se diretiva antecipada de vontade. Informalmente já está ficando conhecido como testamento vital.
Na decisão do paciente, com a orientação ou ajuda de seu médico, poderá constar se vai querer, entre outros exemplos, usar respirador artificial, tratamentos dolorosos ou mesmo a reanimação na ocorrência de parada cardiorrespiratória (exemplos que retirei do sítio do CFM). Segundo a resolução, essa diretiva do paciente deve ser registrada pelo médico no prontuário.
Nada mais justo do que o próprio paciente poder escolher se quer ou não prolongar sua vida, que muitas das vezes nada mais é do que prolongar seu sofrimento e, sem a menor sombra de dúvida, o sofrimento de seus familiares e amigos. E esta dor física do paciente muitas vezes é indescritível, tornando-se, em não raras situações, uma tortura psicológica para os mais próximos.
Permitir que o paciente, devidamente informado e orientado por seu médico de confiança, tome a decisão sobre seu próprio futuro quando acometido de uma doença terminal é um ato humanitário com todos. Qual, afinal, o sentido de postergar a morte com tratamentos paliativos que não salvarão o paciente, gerando, algumas vezes, apenas o prolongamento da dor?
Nesta linha de raciocínio, não consigo conceber, também, a eutanásia como homicídio. Às vezes o fluxo natural é muito lento, a dor muito severa e o sofrimento insuportável. Restringir-se à ortotanásia, nestes casos, deixando que a doença vagarosamente destrua qualquer resquício de dignidade daquele ser humano enfermo soa-me como um exercício de crueldade e sadismo.
Os passos estão sendo dados. É importante, para a evolução do próprio ser humano, que dispamo-nos de preconceitos metafísicos e aceitemos que é muito mais louvável precipitar sem sofrimento o que já está fadado a acontecer.
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Um comentário:
Imensamente feliz com essa informação, que pelo menos pra mim, é uma novidade.
Pelo menos em alguns aspectos, estamos caminhando de volta em busca dessa tal de 'humanidade', que há tempos estava sendo perdida. É comum ouvir que só quando chega num colapso que a coisa muda, mas algumas coisas (como essa) fazem reacender um pouquinho de esperança em mim.
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